Renata Rimet

Inspiração guardada não respira, verso é vício e vice versa...

Textos


Salvador é cidade de muitos becos e vielas, a batalha para definir o território é grande, já vi coisas horríveis acontecer por conta de um cantinho do espaço público, em geral me afasto, evito problemas e assim vou levando, um dia ali, outro acolá, mas sem confusão para meu lado, sou totalmente contra a violência, principalmente contra minha pessoa...

Ali, deitada sob a marquise, protegida com um velho lençol observava o movimento de entrada e saída de veículos na feira da Sete Portas, também conhecida como antiga rodoviária, mas num tempo que nem andava por aqui. Desde que cheguei conto e reconto as entradas e o calculo não bate, é uma entrada e uma saída, e onde ficam as sete portas é um mistério sem resposta.

O cheiro do tempero fresco é forte e agradável, aquelas vozes quebrando o silêncio da madrugada e o bater de caixas dão o tom do dia, amanheceu para muitos enquanto o sol ainda nem apareceu para tantos outros, mas se quiser tomar um café a hora é esta, com um pouco de sorte ainda tem umas frutas... 

Antes do primeiro passo ouço vozes exaltadas, parece uma briga, alguém tentou tirar vantagem do vendedor de frutas, nervoso sacou a arma e disparou, ouvi três estouros, perdi a fome, o sono e a coragem de atravessar a rua, o aroma de tempero fresco que o vento trazia foi anulado, o cheiro de morte nas primeiras horas do amanhecer é vermelho, vermelho sangue.

Peguei minha cartela de prozac, ainda tinha uma capsula, engoli a seco, virei pro outro lado e comecei fazer de conta que estava tudo bem, pensei em Vladimir enquanto esperava Godot, e mesmo sem acerto prévio, ou sem a árvore que indica o local de encontro, permaneci ali, como se o esperasse...
Renata Rimet
Enviado por Renata Rimet em 07/06/2014
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